sexta-feira, 20 de junho de 2025

Nuances do Ser



Eu sou cor que muda de nuance
perante a luz que me alumia,
sou sombra tênue em dança errante,
sou alvorada em melancolia.

No espelho d’água do pensamento,
me vejo em tons que o tempo inventa;
sou mar sereno, sou vento lento,
sou tempestade que se apresenta.

Me desfaço em matizes de esperança,
me refaço em silêncios de poesia;
sou o azul que o horizonte balança,
sou o dourado que o sol anuncia.

Se me buscas, serei transparência,
se me tocas, serei melodia—
eu sou cor que muda de nuance
perante a luz que me alumia.


quarta-feira, 4 de junho de 2025

ECO DE UM SILÊNCIO


Nossos olhos se perderam na névoa
de prédios, fumaça, promessas partidas.
O horizonte é só miragem,
e o azul, uma lembrança antiga.


O olfato se rende ao asfalto quente,
aroma de pressa, de medo, de ausência.
As flores? Restaram nos retratos
amarelados das avós.


A boca mastiga rotina,
engole o seco, engasga no vazio.
O sabor da esperança
evaporou-se no café requentado.


Sonhos?
Escalam muros de concreto,
buscam frestas,
mas tropeçam em grades invisíveis.


Enquanto houver:
quem enxergue e desvie,
quem desista antes de tentar,
quem esqueça o vizinho no frio.


Da criança que brinca com pedra,
do velho que conversa com o vento,
da mãe que costura o amanhã
com linha curta e agulha torta.


Não houve um sussurro de cuidado.


Só o silêncio
ecoando nos becos,
um silêncio espesso,
um silêncio cansado.


É triste precisar
de um trovão para acordar.


Um trovão, não uma brisa.


Um trovão que estremeça
os alicerces do descaso.


Um trovão
que rasgue a noite dos esquecidos.


Remédio do pobre:
o sono interrompido,
o sonho adiado,
o riso escondido.


Para disfarçar nesta máscara:
o medo de não ser visto,
a dor de não ser ouvido.


A angústia de ver o filho
com fome de futuro,
o teto pingando promessas,
a panela vazia de esperança.


A mulher cuja força
se esconde no cansaço.


Um trovão de protesto:
quem decide, repete
"faça o que puder",
e muda de canal,
e troca de assunto.


Um trovão de verdade,
no grito coletivo,
quando a injustiça apita,
quando o tempo se esgota,
quando a esperança é expulsa.


Um trovão urgente,
triste-forte,
forte-triste.


Num tempo em que silenciar
é morrer devagar.